A amamentação é fonte de benefícios para crianças e mães, além de ser ambientalmente segura e natural, mas há algumas dificuldades comuns entre elas no início desse processo.
Grazi Mantovaneli que é enfermeira há 12 anos, especialista em emergências e UTI, em Pediatria e Neonatologia, também trabalhou como enfermeira da Atenção Básica e é tutora em Aleitamento Materno e Alimentação Complementar pelo Ministério da Saúde, falou ao JTNEWS [no qual é colunista], sobre o trabalho que desenvolve nessa importante área de 'aleitamento materno'.
Em entrevista exclusiva para o JTNEWS, Grazi Mantovaneli que desde 2014 é consultora em Aleitamento materno e recentemente, unindo a paixão por Saúde da Criança e artes, ilustrou o livro “Amamentar: entre o querer e o poder”, falou sobre a importância, principais desafios, amamentação em tempos de Covid-19, entre outras dúvidas que envolve o universo que é o Aleitamento Materno.
Antes de mais nada devemos entender que o aleitamento materno é uma prática fundamental para o desenvolvimento da criança, que envolve muito mais do que apenas o ato de nutrir, envolve uma grande interação entre mãe e filho com repercussões importantes sobre o desenvolvimento cognitivo, estado nutricional e emocional da criança.
Amamentação
JTNEWS: O que é amamentar?
Grazi Mantovaneli: Como sabiamente disse a Dra. Lylian Dalete (autora do livro que ilustrei: Amamentar: entre o querer e o poder): “Amamentar é fazer escolhas diárias e prosseguir. Colher os frutos do empenho, da luta; usufruir das delícias do contato, do convívio, do toque, das trocas de olhares, da visão do filho crescendo com saúde.”
Amamentar pode e deve ser leve, mas para isso, as orientações e cuidados já devem iniciar na gravidez. Daí a importância de se ter o auxílio de uma consultora em amamentação.
JTNEWS: O que faz uma consultora em Aleitamento Materno?
Grazi Mantovaneli: É uma profissional capacitada e qualificada para auxiliar mãe, pai, bebê e a família. Ela atua desde antes do nascimento do bebê (ainda na gestação), na maternidade, na chegada do bebê em casa, presta cuidados ao bebê e à mãe, previne desconfortos (atuando de maneira preventiva e em meio às intercorrências que possam aparecer), nos problemas e dificuldades relacionadas à amamentação (avalia a amamentação, a pega correta, desde a postura da mãe, posicionamento, avalia as mamas, avalia a boca e a sucção do bebê, ordenha de leite, cuidados com a mama etc) e, caso a mãe passe por alguma dificuldade, ela será o apoio e prestará todos as orientações e para buscar resolvê-las.
JTNEWS: Qual a duração ideal para a amamentação?
Grazi Mantovaneli: A Organização Mundial de Saúde (OMS) e o Ministério da Saúde recomendam que:
Exclusivo até os 6 meses, ou seja, nesse período a criança deve receber apenas o leite da mãe.
Complementar dos 6 meses aos 2 anos. A mãe segue com o aleitamento materno, mas outros alimentos também são inseridos na dieta da criança (com acompanhamento de um profissional), o que chamamos de Alimentação Complementar. Após esse tempo, a alimentação da criança segue a mesma da família.
JTNEWS: Quais os benefícios comprovados da amamentação?
Grazi Mantovaneli:1) Para o bebê (recebe os anticorpos da mãe):
- Recebe a nutrição e hidratação corretas e se desenvolve muito bem;
- Adoece menos;
- Protege contra diarreia, infecções respiratórias, pneumonia, dor de ouvido, meningite;
- Diminui alergias, asma, diabetes, obesidade, hipertensão e colesterol alto;
- Maior facilidade de aprendizado (bebê que mama é mais inteligente);
- Desenvolve toda a musculatura da face e cavidade oral;
- Tem boa fala e boa respiração;
- Favorece a recuperação de peso do recém-nascido;
- Diminui a icterícia (amarelão) e previne a hipoglicemia (queda dos níveis de açúcar).
2) Os benefícios para a mãe:
- Diminui o sangramento pós-parto, reduz as chances de anemia;
- Faz o útero voltar ao tamanho normal, mais rapidamente;
- Reduz as chances de ter câncer de mama e de ovário, diabetes e de infartar;
- Ajuda a mulher a perder o peso que ganhou durante a gravidez;
- Fortalece o vínculo mãe-filho;
3) Os benefícios para o seu tempo e bolso... (risos)
- Já está pronto na mama (temperatura correta, quantidade correta, nutrientes corretos);
- Não precisa ser comprado, nem preparado (não utiliza água, gás, energia elétrica, embalagens, nem gasta seu tempo, nem seu dinheiro);
- Onde você estiver, é só colocar o bebê para mamar e pronto!
JTNEWS: A Organização Mundial da Saúde (OMS) classifica o 'aleitamento materno' em subtipos, você poderia nos explicar como funciona cada um?
Grazi Mantovaneli: Sim, claro! Existe o aleitamento materno exclusivo, aleitamento materno complementado e a alimentação complementar. Vou explicar um pouco sobre cada um deles:
- Aleitamento Materno Exclusivo: é preconizado pela OMS e Ministério da saúde. Até o 6º mês de vida a criança deve receber apenas o leite materno (sem acrescentar água, chás, suco ou outros líquidos). O leite materno já contém tudo que o bebê precisa até os seis meses de vida, inclusive para quem reside em lugares quentes.
- Aleitamento Materno Complementado: existem algumas situações em que será necessário ofertar outro tipo de leite (que não o materno) para “complementar” as mamadas; quando a mãe não consegue produzir a quantidade necessária de leite para o bebê. São situações pontuais como, mãe com histórico de cirurgia na mama, retirada de mama, problema na anatomia da mama, problemas hormonais etc.
- Alimentação Complementar: também segue as recomendações da OMS e Ministério da Saúde, pois após os 6 meses (e até os 2 anos), as necessidades nutricionais do bebê mudam. Então, o leite materno continua a ser oferecido, mas outros alimentos são introduzidos na dieta (com auxílio de um profissional devidamente capacitado) para que a criança continue a crescer de forma saudável.
JTNEWS: Existem técnicas para garantir que o bebê tenha uma amamentação eficaz?
Grazi Mantovaneli: Sim, existem, não apenas técnicas, mas todo o ambiente e as condições da mãe e do bebê influenciam. É aí que a consultora em Aleitamento Materno entra, para avaliar as mamas, a boca do bebê, a forma que a mãe amamenta o bebê e o modo que o bebê suga o leite, o estado geral de saúde do bebê e da mãe, o ambiente para a amamentação e etc.
JTNEWS: Como funciona o desenvolvimento das mamas para produzir leite materno?
Grazi Mantovaneli: Todo esse mecanismo é complexo para ser explicado aqui, mas existe a atuação de diversos hormônios femininos, já na puberdade. O tamanho das mamas e o seu formato varia de mulher para mulher, mas não interfere na produção de mais ou menos leite.
Na gravidez, há o aumento desses hormônios que estimulam o desenvolvimento das glândulas mamárias. Resumidamente, no final do trabalho de parto existe a queda de alguns hormônios e o aumento de outros. Amamentar na primeira hora de nascimento é de extrema importância, pois nesse contato “pele a pele” é onde acontece o maior estímulo para a amamentação, além de manter o bebê aquecido e de ajudar na contração do útero (o que diminui o risco de hemorragia pós-parto).
As primeiras 24 horas são fundamentais para a amamentação, e é onde podem surgir algumas dificuldades, que se não forem solucionadas e orientadas por uma profissional, atrapalharão a amamentação.
JTNEWS: Como ocorre a produção diária de leite?
Grazi Mantovaneli: O leite é produzido conforme as necessidades do bebê, ou seja, quanto mais ele mamar, mais leite será produzido (processo chamado de “oferta e procura”). Sempre que o leite é removido dos seios, seja pela mamada do bebê ou pela extração, mais quantidade é produzida. Cerca de 1/3 do leite está na mama e os outros 2/3 são produzidos enquanto o bebê está sugando. Por isso, dizemos que as mamas são fábrica e não estoque de leite!
JTNEWS: Quais os principais desafios à manutenção do aleitamento materno?
Grazi Mantovaneli: Amamentar vai muito além do vínculo “mãe-filho” e do amor entre eles; envolve também dedicação, confiança, apoio e informação. Algumas mães que passam por este momento de forma tranquila, muitas outras enfrentam desafios, entre eles, o tempo que o leite leva para descer, as dificuldades do filho para pegar bem o peito, as dores na hora de amamentar, a falta de apoio para amamentar etc. Mas com o suporte de uma consultora em aleitamento materno e o apoio da família, ela vai transpor as dificuldades existentes, fortalecer a relação entre os dois e vai transpor essa fase com muito afeto e aprendizado.
JTNEWS: O que é a Crise transitória na lactação?
Grazi Mantovaneli: Não acontece com todos os bebês, mas se ocorrer, aparece por volta dos três meses de vida e é transitória (vai se resolver em menos de uma semana). O que acontece? Devido o crescimento rápido da criança, seu estômago aumenta e com isso seu apetite pelo leite também. Ele passa a querer mamar em intervalos menores para suprir a sua necessidade, ele pode chorar mais e encurtar o tempo entre as mamadas. A mãe pode achar que por suas mamas estarem mais vazias, não está suprindo corretamente deu bebê, mas é só um período de ajuste e seu corpo vai se adaptar, mas é preciso tempo e dedicação. Lembra que eu falei que as mamas são fábrica (e não estoque)? Não precisa entrar com nenhum outro tipo de leite. Com suporte profissional, amor, calma, persistência e paciência, tudo vai se ajustar e passar.
Amamentação em tempos de Covid-19
JTNEWS: Em tempos de pandemia da Covid-19 pode amamentar?
Grazi Mantovaneli: Sim, não só pode como deve (risos!). Estudos recomendam a continuidade do aleitamento materno. Todas as evidências científicas apoiam a amamentação, pois até o presente momento, não se detectou a transmissão do vírus pelo leite materno.
JTNEWS: Mas e se a mãe apresentar algum sintoma de Covid-19? Deve amamentar?
Grazi Mantovaneli: Sim, deve. Mas ela precisa tomar alguns cuidados antes de amamentar: deve prender os cabelos, colocar máscara, trocar de roupas e higienizar os braços e mãos (com água e sabão ou álcool). As mamas não precisam ser lavadas (exceto, se tossiu ou espirrou sobre elas). Outra opção é seguir todas essas medidas e ordenhar o leite e oferecê-lo para o bebê usando copinho ou colher (previamente limpos). Assim, manterá sua produção de leite e não correrá o risco de diminuir ou cessar a produção.
Muito importante: Se o bebê ficar doente, continuar a amamentação. Ele será nutrido/alimentado e receberá os anticorpos da mãe através do leite materno.
JTNEWS: Leite materno protege contra o coronavírus?
Grazi Mantovaneli: Não apenas contra o coronavírus, mas contra várias doenças. Ao amamentar, a mãe passa toda a sua imunidade adquirida (construída durante a sua vida) para o bebê. Especialmente, no colostro (o primeiro leite que ela produz após o parto), chamamos esse leite de “primeira vacina”.
Existem estudos que comprovaram a presença de anticorpos no leite materno, de mães que foram vacinadas (e/ou que tiveram a doença) e que são capazes de neutralizar o vírus da Covid-19.
O JTNEWS agradece à Grazi Mantovaneli pela excelente contribuição acerca de tema tão relevante como o 'aleitamento materno'.
Fonte: JTNEWS