Uma marcha convocada pelo partido do presidente colombiano, Iván Duque, levou centenas de pessoas às ruas de Bogotá neste domingo (30/05) para reclamar dos bloqueios de estradas que estão sendo realizados por apoiadores dos protestos contra o governo.
O fechamento das rodovias e a greve geral convocada pelos manifestantes anti-Duque tem impedido o abastecimento de várias cidades. Os apoiadores do presidente também pediram o fim da violência nas manifestações, em um ato que foi chamado de "Marcha do Silêncio" e que ocorreu também em outras cidades do país.
Na capital, houve um um início de confronto entre a marcha governista e apoiadores da greve nacional, mas o enfrentamento foi controlado pela ação da polícia.
O país acaba de completar um mês de turbulência social. Os atos começaram como uma revolta contra uma reforma tributária, mas acabaram crescendo para incluir uma agenda que contém várias demandas.
Entre outros pontos, os manifestantes pedem mais empregos, acesso à saúde e educação e a implementação de uma renda básica mínima durante a pandemia. Também pessionam pelo fim do uso do glifosato, utilizado para destruir as plantações de coca —o tema é controverso, já que a substância química pode causar o câncer.
Além disso, os protestos exigem ainda uma reforma da própria policia nacional, que é controlada pelo Exército. Muitos dos atos realizados até o momento terminaram em confrontos entre os manifestantes e as forças de segurança, em especial em Cali, a terceira maior cidade do país. Ao todo, segundo a Defensoria do Povo, já são 59 os mortos pelos embates, sendo 13 apenas na última sexta (28/05).
José Miguel Vivanco, diretor da divisão das Américas da ONG Human Rights Watch, disse à Folha que o "repetido desrespeito aos direitos humanos na repressão aos protestos tem o efeito de colocar mais lenha na fogueira das próprias manifestações. Ou seja, as pessoas já saem agora mais por descordar desse tipo de Estado que reage assim do que pelas pautas iniciais do processo".
Para ele, Duque "se equivoca ao dar mais demonstrações de uso das forças de segurança nacional, como o Exército, porque são um símbolo de intolerância e de que não há desejo real de diálogo".
Vivanco também critica as afirmações do presidente colombiano de que a violência tem sido causada por grupos de estrangeiros organizados. O diretor da ONG considera que a hipóteste não pode ser descartada, mas também não pode ser comprovada nesse momento. "Insistir todas as fichas de seu discurso nessa narrativa do vandalismo pago por forças de fora passa uma mensagem muito ruim aos colombianos, a mensagem de que as suas bandeiras, suas reivindicações não são legítimas. E são", completou ele.
Vivanco cobra ainda que Duque cumpra sua promessa de que não toleraria abusos policiais contra os manifestantes.
Em meio ao aumento dos atos, o presidente deu início a uma série de negociações um comitê formado por lideranças de alguns dos setores envolvidos nos protestos, mas as conversas não chegaram a um acordo
Nos últimos dias, nas ruas, um dos gritos de guerra que se ouvem é o de que "o comitê de greve não nos representa".
"É preciso ficar claro que o que vemos nas ruas são jovens que não se veem representados nem na política nem nessas negociações que estão sendo realizadas em seu nome. Isso, nos últimos dias, tem se tornado também um motor da instatisfação geral", disse o analista político Ariel Ávila.
"A juventude colombiana que já tinha se posicionado com sua agenda de reformas do Estado em 2019, agora voltou as ruas com ainda mais bronca, porque quando se olha para os números do aumento da pobreza, os jovens também são a franja mais afetada, são os que estão sem emprego e sem perspectivas", completou.
A pobreza na Colômbia cresceu 6 pontos percentuais desde o início da pandemia, e hoje é de 42,5%. E o aumento do desemprego juvenil também cresceu. Entre os colombianos de 18 a 28 anos, a desocupação foi de 20,5%, em 2020, para 23,9%, em 2021.
Uma pesquisa divulgada pelo instituto Invamer, neste domingo indica que 89% dos entrevistados estão de acordo com as manifestações, mas 95% desaprovam que elas sejam violentas. Sobre a atuação do Esmad (o batalhão anti-distúrbios da polícia colombiana), 55% dizem discordar do modo como usam a força. E 60% pedem o fim do bloqueio das ruas e estradas.
A analista Elizabeth Dickinson, do International Crisis Group considera que a mesa de diálogo "deve incluir mais atores, e abrir o leque das demandas dos jovens, pois são a maioria dos que estão nas ruas".
Para Ávila, não há ânimo para interromper os protestos. "Não vejo que isso vá parar logo. Não vejo desânimo ou cansaço dos que estão saindo todos os dias. E só creio que esses protestos podem ser amenizados uma vez que entregas reais e concretas sejam feitas pelo governo".
Fonte: JTNEWS com informações da Folha de São Paulo