A recente fuga de dois presos do presídio federal de segurança máxima de Mossoró, no Rio Grande do Norte, será tema de audiência reservada da Comissão de Segurança Pública (CSP) do Senado Federal. Na reunião, que será feita em caráter restrito, devem ser ouvidas autoridades do Ministério da Justiça e Segurança Pública ligadas ao sistema penitenciário. A reunião está marcada para terça-feira (27/2), às 11 horas.
Confira ainda nesta edição o artigo No Contexto do Fato; de autoria do advogado constitucionalista, Jacinto Teles Coutinho, que é ex-presidente da Associação dos Policiais Penais do Brasil (Ageppen-Brasil); conselheiro penitenciário do Estado do Piauí e presidente da Comissão de Estudos Constitucionais da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-Piauí) e Editor do JTNEWS.
De acordo com as investigações, os dois fugitivos teriam feito um buraco no teto das celas onde estavam durante a madrugada. Depois de acessarem uma área de tubulações de água e ventilação, eles teriam chegado a uma área externa, onde usaram ferramentas deixadas por trabalhadores de uma obra que está sendo feita no presídio para cortar o alambrado e escapar.
— É a primeira vez que isso acontece no sistema penitenciário federal. As penitenciárias federais sempre foram uma referência: sem fuga, sem rebelião, sem celular, e têm sido utilizadas desde 2006 para isolamento das lideranças do crime organizado e outros presos perigosos. Fomos agora surpreendidos por esse evento e não podemos ficar alheios a esse debate sobre os presídios federais — disse à Rádio Senado o senador Sergio Moro (União-PR), autor do pedido para a audiência.
Em pronunciamento em plenário na terça-feira (21), o senador afirmou que a fuga representa um precedente perigoso e que é necessário investigar as falhas que levaram à fuga e tomar medidas para garantir que fatos semelhantes não mais ocorram.
Foram convidados para a audiência o secretário nacional de Políticas Penais do Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP), André de Albuquerque Garcia; o diretor do Sistema Penitenciário Federal, Marcelo Stona; e o diretor de Inteligência Penitenciária da Secretaria Nacional de Políticas Penais do MJSP, Sandro Abel Sousa Barradas.
Em razão do tema, a reunião não será transmitida. Além dos debatedores e parlamentares, só poderão participar servidores da CSP e um assessor de cada senador e de cada convidado.
NO CONTEXTO DO FATO | POR JACINTO TELES
Indiscutivelmente, tal reunião de discussão sobre a fuga dos dois detentos da Penitenciária Federal de Mossoró no Rio Grande do Norte terá grande importância, não somente para o caso específico, mas para o Sistema Penitenciário Federal como um todo, que, aliás o presidente do Senado Rodrigo Pacheco e os signatários da proposta deveriam ampliar a discussão para incluir integrantes do Sistema Penitenciário Nacional, pois essa discussão não pode ocorrer desconectada do contexto nacional.
Notadamente entidades representativas dos Policiais Penais Federais e dos Estados, a exemplo da Associação dos Policiais Penais do Brasil (AGEPPEN-BRASIL), do Fórum Nacional de Segurança Pública, bem como de representante do Conselho Nacional dos Secretários de Estado de Justiça e de Administração Penitenciária (CONSEJ), do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) deveriam sim, fazer parte dessa importante discussão.
A partir de uma discussão transparente [mesmo que secreta, pois com os atores principais] se conseguirá um retrato contemporâneo e real do cenário do sistema prisional brasileiro, não somente do sistem federal. Considerando que todos sabem, inclusive, e, principalmente o Congresso Nacioanl e os governos central e regionais do caos que se encontra enraizado nesse combalido sistema, não raramente sob o olhar cadente da classe política nacional.
Sem esquecer que recentemente fora confirmada sua situação [do sistema penitenciário] cruel, degradante e asssim denominado de "estado de coisas inconstitucional" pelo Supremo Tribunal Federal (STF), por meio do julgamento [agora de mérito] da ADPF 347 - Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental ajuizada pelo Partido PSOL, que desencadeou uma série de medidas a serem implementadas pelos governos federal, estaduais e distrital por determinação da Suprema Corte.
Espera-se que o Senado Federal enfrente essa situação com a atenção e a sensibilidade humana que se impõe de forma imprescindível. E considere nesse contexto: que, assim como é necessário que garanta a segurança dos estabelecimentos penais do País, é igualmente necessário que priorizem a ressocialização e, principalmente as condições de trabalho, econômicas e de aumento do efetivo dos policiais penais e demais servidores a nível nacional.
Óbvio que tudo isso passa necessariamente pela Regulamentação da Polícia Penal do Brasil junto a todos os entes federados, por imposição constitucional e necessidade social.
O Senado da República teve papel fundamental na aprovação da Emenda Constitucional que culminou com a efetivação da alteração constitucional do art. 144, que colocou no seu rol taxativo a Polícia Penal da União, dos Estados e do Distrito Federal, por meio da Emenda Constitucional Nº 104/2019, cuja autoria inicial ficou a cargo do então senador Cássio Cunha Lima da Paraíba, que obteve o especial apoio do então presidente do Congresso Nacional David Alcolumbre que a promulgou. Ele que atualmente preside a Comissão de Constituição e Justiça da Câmara Alta do País.
O Senado Federal, lamentavelmente, ainda não se manifestou acerca da famigerada proposta de privatização prisional levada a cabo pelo ex-presidente Jair Bolsonaro tendo como suporte o ex-ministro da Justiça Anderson Torres, o qual defendia escancaradamente a privatização prisional. Lamentável porém, que o governo Lula tenha ratificado integralmente essa política privatista prisional, que, na contramão do que sugeriu a equipe do Grupo de Trabalho (GT) que discutiu a Execução Penal no Governo de Transição de Lula de que o Decreto Nº 10.106/2019, que trata de investimento de dinheiro público na privatização no sistema penitenciário seria revogado nos primeiros 100 dias de gestão do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o que não ocorreu.
O que se viu foi no dia 26 de abril de 2023 o governo, por meio de decreto assinado pelo vice-presidente Geraldo Alckmin, autorizando o financiamento de propostas de privatização na segurança pública e no sistema prisional, através do Banco Nacional de Desenvolvimento Social (BNDES), mesmo com posições contrárias de alguns membros do alto escalão do Governo Federal ainda persiste essa ideia malevolente que jamais deu certo no Brasil ou no Mundo, aliás aqui no Brasil foi um desastre total, que oportunamente discorreremos sobre o caso emblemático de Rebeirão das Neves em Minas Gerais, do Amazonas e mais vários estados na contratação temporária de "agentes penais" batizados de monitores penais.
A privatização prisional tão bem defendida por uma parte dos políticos que, não raras vezes são financiados por empresários do setor de privatização penitenciária, defendem-na de forma inescrupulosa tal proposta sem jamais identificar ou comprovar os avanços para o sistema penitenciário e para a segurança pública da sociedade.
Essa nefasta inciativa não é apenas temerária para os policias penais e demais servidores e detentos do sistema que sofrerão diretamente suas consequências, como a desvalorização em suas carreiras que serão precarizadas ainda mais, a exploração da mão de obra dos presos de forma inadequada, mas é irrefutavelmente uma garantia do aumento exacerbado da corrupção nessa área da "política penitenciária".
A sociedade vai sentir fortemente o aumento do caos nas prisões seja pelo aumento desenfreado do encarceramento, seja no aumento das organizações criminosas a partir do interior dos presídios; que, ao invés de observar melhores condições de trabalho e maior controle de fiscalização social vai comprovar sim, o aumento da vulnerabilidade, a partir da precarização da força de trabalho que será imposta fragilizando o cumprimento constitucional do concurso público e será muito pior com relação à formação policial penal que deve ser calcada nos parâmetros referentes à segurança pública e do entendimento de que há que se investir na ressocialização, cujas funções são plenamente compatíveis basta que se tenha a efetivação de políticas de formação inicial e continuada sob a égide da cidadania, mas para que isso aconteça os governos e os parlamentos devem priorizar o sistema prisional brasileiro, fato que jamais ocorreu de forma uníssona, inclusive sem desprezar as boas iniciativas já existentes no serviço público prisional.
Não se pode olvidar que o Poder Judiciário e o Ministério Público têm muito o que contribuir nessa área também, não obstante, o avanço do CNJ e do CNMP com suas ações voltadas à busca de solução nessa área, a exemplo de implementação de medidas alternativas à prisão.
Muito ainda deve ser feito, como: ouvir os atores que executam ou não a política de Execução Penal do País, sendo o pessoal penitenciário especializado e os policiais penais, esses que verdadeiramente são os responsáveis diretos para executar as penas privativas de liberdade, sequer existe uma política unificada formação e qualificação e de preservação da saúde mental desses profissionais que estão submetidos a um alto índice de stress no sistema.
Confira Nota Técnica de dezenas de Entidades contra a Privatização Prisional.
Fonte: JTNEWS com informações da Agência Senado