Alguém poderia me perguntar: por que a presença dela é real em sua vida, se ela já se foi, há anos?!
É, sim, Mãe, tua presença em minha vida é real! Hoje mais do que ontem...
Porque, a cada momento, tua lembrança é marcante em meu viver, teu exemplo de mãe, de esposa, de avó, de amiga, de solidariedade, de perseverança e de fé, renova-me a esperança compartilhada com a certeza de que o amanhã é garantia irrefutável do nosso reencontro.
Esta certeza é tão notável em ‘meu viver’, tal qual a lembrança mais especial que tenho de ti, mãe, com o Rosário de Nossa Senhora em tuas mãos, e comigo, ajoelhando-se ao chão, rezando a Ave Maria e o Pai Nosso [na hora do ângelus, às 18:00 horas], e ao final do oferecimento, dizíamos juntos: “Bênção, meu Pai do Céu! Bênção, minha Mãe do Céu! Me crie para o bem e me faça um servo de Deus! Amém!"
O cenário era lá em casa (foto) em nossa roça no pé do morro, no Alto do Tirindidin, no Sertão Nordestino de Jaicós do Piauí, onde nasci e fui criado por ela, Adelina Evangelista Teles e meu pai, Manoel Rodrigues Coutinho, ambos na Eternidade.
Aquela cena é sempre real em meu viver, pois ali até poderia faltar o pão para nossa alimentação - como de fato faltou [na seca de 70] -, mas não nos faltava a oração.
No fim daquele fatídico ano, eu tinha pouco mais de cinco anos de idade, porém - "lembro-me, como se fosse hoje;" numa “noite longa” (parafraseando meu pai) - levantei-me da rede e fui à tua, mãe, e lá percebi que chorava como jamais havia visto. Lembro-me que imediatamente perguntei: por que mãe tá chorando? “Porque amanhã não tem comida para você, meu filho...” Voltei à minha rede e chorei copiosamente... e entendi perfeitamente que no ‘amanhã’ minha mãe também estaria com fome.
Daquela frase e daquele momento nunca mais me esqueci. E deve ter sido obra do Espírito Santo de Deus [creio, sim], porque em todos os desafios por mim enfrentados, aquele momento tem servido de supedâneo para melhor enfrentá-los, e sempre me vem a disposição de vencê-los.
A senhora partiu, sim, e de forma inesperada; não nos despedimos; lamentei muito, mas hoje entendo que foi melhor ter sido assim, porque a despedida nem sempre é a melhor opção de dizer adeus. Enquanto estávamos juntos, material e espiritualmente, só me recordo de termos ficado apenas um dia das mães separados, sem trocarmos nosso afeto, nosso carinho, nosso amor; fora justamente no ano de sua partida para a Eternidade; e um dia, quiçá terei a oportunidade de dizer o porquê.
Com certeza, mãe, a senhora me abençoou naquele dia [no dia em que nos deixou], naquele dia em que não faço questão de lembrar a data, tampouco o mês, talvez nem o ano; por opção, recuso-me a querer marcar no calendário, pois o fato é impossível de esquecê-lo.
A única data que prefiro lembrar, mãe, é a do seu aniversário - 26 de dezembro -, porque esta, inevitavelmente, é a que marca a minha vida ligada à tua, mesmo eu sendo o teu vigésimo filho; entretanto foi a partir de teu natalício, em 26 de dezembro de 1920, que verdadeiramente nasci.
Sei que a senhora, está bem, porque somente praticou o bem, e sobretudo porque foi detentora de uma fé inigualável e resiliência sem tamanho, aliás sem saber, sequer o que significava. E porque tem certeza que estou como lhe prometi que estaria: lutando, em paz e com dignidade. Até nosso reencontro... Amém!
Jacinto Teles é jornalista, advogado, sertanejo e filho de dona Adelina.
Fonte: JTNEWS