No último sábado (08/01), uma rocha desabou e atingiu lanchas que estavam no Lago de Furnas, ponto turístico localizado em Capitólio (MG), cidade localizada a cerca de 280 quilômetros da capital Belo Horizonte.
Na tarde desse domingo (09/01), o Corpo de Bombeiros confirmou dez mortes. Pelo menos 32 pessoas ficaram feridas. A estimativa da corporação é de que, no momento do acidente, em torno de 70 turistas estavam no local.
Vídeos publicados nas redes sociais mostram o momento em que uma grande rocha desliza e cai sobre a água, atingindo pelo menos três embarcações. Pouco antes da queda, é possível ver guias turísticos alertando sobre o iminente desabamento.
O porta-voz do Corpo de Bombeiros de Minas Gerais, o tenente Pedro Aihara afirmou que as fortes chuvas que vêm atingindo o estado podem ter relação com o acidente e alerta para o risco de outras ocorrências. “É possível que haja novos acidentes, porque a água das chuvas penetra nas rochas, que têm menor resistência à ação da água e de vento”, afirmou.
A área onde ocorreu um deslizamento é um cânion. Ou seja, um vale profundo cercado de rochas que formam uma espécie de paredão natural. Em entrevista, Aihara afirmou que as visitas a áreas rochosas devem ser evitadas em épocas com altos índices de chuvas.
Ainda de acordo com o tenente, a maneira como a rocha caiu é atípica. “A forma de escorregamento não costuma ser para frente, é como se fosse uma fatia de um pedaço de uma torta escorregando naturalmente. Mas essa estrutura caiu como um dominó. A parte lá de cima que cai numa trajetória perpendicular intensificou o dano que as embarcações sofreram”, disse.
“Sofremos hoje a dor de uma tragédia em nosso Estado, devido às fortes chuvas, que provocaram o desprendimento de um paredão de pedras no lago de Furnas, em Capitólio. O Governo de Minas está presente desde os primeiros momentos através da Defesa Civil e Corpo de Bombeiros”, afirmou, pelo Twitter, o governador Romeu Zema (Novo).
“Solidarizo com as famílias neste difícil momento. Seguiremos atuando para fornecer o apoio e amparo necessários”, acrescentou Zema.
Responsabilidades
Ainda no sábado, a Marinha informou que irá abrir um inquérito para investigar as circunstâncias que provocaram o desabamento. Além da investigação, a Marinha afirmou que enviou equipes para auxiliar nos trabalhos de resgate.
“O inquérito aberto para apurar as circunstâncias do acidente/fato ocorrido analisará os aspectos sobre a segurança da navegação, a habilitação dos condutores envolvidos, o ordenamento aquaviário do local e a observância das normas e legislações emanadas pela Autoridade Marítima”, diz a Marinha.
Por meio de nota, a empresa Furnas Centrais Elétricas declarou que “lamenta o ocorrido e se solidariza com as vítimas do acidente, familiares e amigos”. A companhia disse ainda que “está dando apoio às autoridades locais nas ações de socorro aos atingidos”. “A empresa esclarece que utiliza o lago para a geração de energia elétrica e que não é a responsável pela gestão dos usos múltiplos do reservatório, como atividades de turismo e lazer”, finalizou.
Joana Sanches, professora de geologia da Universidade Federal de Goiás (UFGO) e doutora em mapeamento geológico, explica que o local do acidente fica em uma área de risco e o turismo deveria ter sido suspenso na região.
“A área deveria ter sido fechada para o turismo até que se fizesse uma intervenção de técnicos capacitados, além de uma análise mais precisa dos riscos no local. Já havia uma fratura prévia na rocha que se desprendeu. Essa fratura ia desde o topo até a base e são preenchidas pelo solo [terra]. Com a intensidade das chuvas, esse solo que fica entre as fraturas foi lavado e levado embora. Além disso, a água ajudou a fazer mais peso dentro da fratura. Como já estava previamente deslocado do paredão rochoso, com a intensidade dessas chuvas, o pedaço se deslocou por completo”, detalhou.
A pesquisadora explicou que uma das intervenções primordiais seria a derrubada prévia do pedaço de rocha com a realização de um trabalho geotécnica para essa análise. “É preciso debater tais medidas dentro da lei em vigor, o que pode ou não pode se fazer na prática”, complementou.
O secretário Nacional de Proteção e Defesa Civil, do Ministério do Desenvolvimento Regional, coronel Alexandre Lucas, disse que o mapeamento e monitoramento de riscos é uma responsabilidade das prefeituras.
“A Defesa Civil Nacional tem emitido alertas diários sobre essas chuvas. Essas chuvas devem provocar riscos até terça ou quarta-feira. Todas as defesas civis municipais devem procurar monitorar seus riscos e adotar medidas de prevenção”, afirmou o coronel.
O prefeito de Capitólio, Cristiano Silva (PP), disse, nesse domingo (09), que “querer apontar um culpado agora é injustiça”, e tratou o episódio como uma fatalidade inédita para a região.
Erros na evacuação do local
O especialista em gerenciamento de riscos e segurança Gerardo Portela citou uma “sucessão de erros” nos momentos que sucederam o desabamento. Ele lembra que as imagens que circulam nas redes sociais revelam que os ocupantes das embarcações foram alertados pelas pessoas ao redor sobre o risco de desabamento da estrutura. Ainda assim, diz, a iniciativa de se afastar da região de risco demorou a acontecer.
“As últimas imagens revelam o despreparo. Observamos que as lanchas estavam superlotadas, com a proa apontada para o local de risco”, comenta. Segundo ele, as proas das embarcações deveriam estar posicionadas para o lado contrário, de modo a facilitar uma eventual fuga do local. “[Foi] uma sucessão de falhas, pessoas mais distantes estavam percebendo o risco, mas eles ali, mesmo sendo profissionais, não conseguiram ter a atenção certa”, salienta Portela.
Mar’ de Minas
O lago de Furnas, onde ocorreu a tragédia no sábado, é conhecido como ‘Mar’ de Minas. O local recebe grande quantidade de turistas em feriados e épocas de temporadas. Além disso, a região é próxima de áreas urbanas, onde há estrutura de hotéis, pousadas e casas de veraneio para atender a demanda dos visitantes.
Excesso de chuvas
O chefe da previsão do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), Francisco de Assis Diniz, afirma que, em Capitólio, “vão persistir as condições de chuva, porém de maneira não tão intensa como na Grande Belo Horizonte”. Segundo ele, a previsão é de que seja registrada uma precipitação diária entre 20 e 30 milímetros até segunda (10) ou terça-feira (11).
Diniz acrescenta que a região de Capitólio, localizada ao sudoeste de Minas Gerais, já vem registrando grande quantidade de chuvas desde dezembro. “O solo já vem encharcado. Vai adentrando água nas fendas, muitas vezes acumulando, chegando ao ponto em que pode acontecer alguma explosão”, explica.
Não foi só a cidade de Capitólio que sofreu com tempestades no fim de semana. O estado tinha 154 municípios em situação de emergência por volta das 10h30 deste domingo, segundo informou o governador do estado, Romeu Zema, em entrevista à CNN. Mais cedo, relatório da Defesa Civil apontava para 138.
No período da manhã de sábado, foi registrado um transbordamento de um dique no município de Nova Lima, localizado na região metropolitana de Belo Horizonte. Inicialmente, a informação divulgada foi de que houve um rompimento de barragem – o que foi desmentido em seguida. Apesar do susto, não houve vítimas fatais.
A cidade de Nova Lima fica a cerca de 70 quilômetros de Brumadinho, onde, em 2019, 270 pessoas morreram após o rompimento da barragem do Córrego do Feijão. Outros eventos relacionados aos temporais interditaram passagens e destruíram estruturas urbanas em Minas Gerais.
Em Raposos, no norte do estado, uma ponte foi ocupada pela água e o acesso à cidade ficou interrompido naquela área. Além disso, um trecho da rodovia MG-30 foi destruído e, segundo os bombeiros, ainda havia riscos de mais desabamentos.
Em Santa Luzia, a cheia do Rio das Velhas fez com que as águas tomassem uma das principais vias da cidade, a avenida Beira-Rio, e interditasse uma das pontes, segundo informações do portal Notícias de Santa Luzia.
Fonte: CNN Brasil