Censura na Bienal do Livro: tempos sombrios no horizonte
Até quando vamos conviver com essa ameaça?![Capa do livro Imprensa e Censura, Editora Appris](/media/image_bank/2019/9/capa-do-livro-imprensa-e-censura-editora-appris.jpg)
Num país que está se acostumando ao cada vez mais frequente discurso de ódio em nome da “moral cristã”, onde templos de umbanda e candomblé são depredados e queimados em nome dessa mesma “moral cristã”, não deveria causar espanto o último ato em nome da “moral cristã”: a tentativa atrapalhada e fracassada de censura à Bienal do Livro do Rio de Janeiro.
O prefeito-bispo do Rio e da Igreja Universal, Marcelo Crivella, decidiu, sem ter mais com o que se preocupar, mandar fiscais ao prédio da Bienal com ordens para violar a Constituição Brasileira, que proíbe a censura de qualquer natureza, inclusive a artística, para caçar um livro de histórias em quadrinhos.
Qual seria o motivo? Uma HQ com excesso de violência, como é o próprio dia a dia carioca, com cenas de assaltos, explosões e assassinatos? Não, a razão da diarreia censória de Crivella foi o quadrinho Vingadores – a cruzada das crianças por conter uma cena de beijo gay. O motivo da censura não é a disseminação do ódio, mas do afeto entre dois personagens que são do mesmo sexo. Em outras palavras, pura homofobia...
O ódio, na verdade, está nos olhos daquele que vê o mal ali numa história em que existe o amor. Um amor que, em pleno século 21, ainda levanta gestos de intolerância como esse, do chefe do poder executivo de uma das maiores cidades do Brasil.
A tentativa de censura, é claro, não seguiu em frente. Nenhum exemplar do livro foi encontrado na Bienal, que nesta sexta-feira mesmo conseguiu uma liminar na Justiça proibindo novas ações dos fiscais. Na sequência, o presidente do Tribunal de Justiça do Rio, desembargador Claudio de Mello Tavares, cassou a liminar, permitindo a apreensão da HQ com o beijo gay caso não esteja em embalagem lacrada, como se fosse uma revista de pornografia.
O desembargador diz que não é um ato de censura... Mas é sim!!! Não importa se o censor seja um funcionário do poder executivo ou um juiz, se o resultado final é a censura, o nome disso é... CENSURA!
De positivo nessa história toda, bem tosca, bem Brasil atual, está o fato de que os fiscais da prefeitura do Rio tiveram, talvez pela primeira vez na vida, a oportunidade de pisar numa Bienal do Livro.
Outro ponto positivo foi o choque trazido à sociedade por mais essa decisão tresloucada de um governante baseando-se em questões morais.
Mas não é só no Rio que vivemos o que o Ministro do Supremo Tribunal Federal, Celso de Mello, definiu como “... o tempo da intolerância, da repressão ao pensamento, da interdição ostensiva ao pluralismo de ideias e do repúdio ao princípio democrático”.
Vale lembrar que, em São Paulo, o governador João Doria mandou recolher apostilas para adolescentes da 8º série da rede estadual, em torno dos 14 anos, para que não sejam informados sobre a diversidade sexual, tema contido numa página com título “A diversidade de manifestações e expressões da identidade humana”.
Para Dória, que parece estar bastante interessado no apoio do eleitorado conservador para seu projeto de conquistar a presidência de Jair Bolsonaro, o texto faz apologia da “ideologia de gênero”, termo criado por um documento da Igreja Católica no conservador pontificado de Bento XVI e que passou a ser adotado, desde então, em todo discurso contra a população LGBT. O texto da apostila, na verdade apenas explica nomenclaturas e diferenças entre sexo biológico, identidade de gênero e orientação sexual.
Esses atos tenebrosos de censura do pensamento coincidiram, justamente, com a realização do 42º Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação, que reuniu 3 mil pesquisadores, entre professores e estudantes, no campus da Universidade Federal do Pará, em Belém, no qual lancei meu novo livro Imprensa e Censura (tema mais que adequado para o momento).
E é claro que o tema da censura à liberdade de expressão, em todas as suas vertentes - artística, cultural, informativa - foi muito debatido. A censura, que sempre tentou dar as caras ao longo da história brasileira, parece estar perdendo mesmo a vergonha... Ela retorna para nos assustar, mas vem como sempre, tolamente inútil, já que o que ela faz mesmo é dar ainda mais visibilidade ao objeto que tenta esconder, trazendo mais divulgação e discussão sobre o tema proibido.
A imagem do beijo gay dos personagens em quadrinhos, em vez de ser escondida pelas trevas da censura, ganhou até mesmo a primeira página dos jornais e destaque nos sites de notícias.
Já que a censura não funciona na prática, para que continuar insistindo, senhor prefeito e senhor governador... Por quê? Apenas para conquistar votos de conservadores e ultra religiosos? Vale mesmo a pena nos levar de volta às trevas do fanatismo religioso e moral pela sobrevivência política? A resposta, veremos nas urnas...
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