Extinção de cargos públicos: quando a racionalidade é irracional; por Luís Carlos Sales

"No serviço público, qualidade tem relação direta com quem realiza o atendimento e com a existência de alguém para realizar o serviço".

Com a Nota da ANDIFES, publicada a 3 dias do Natal 2023, que manifesta indignação sobre o orçamento das universidades federais de 2024, decidi trazer para o debate o tema da extinção de cargos efetivos no serviço público Federal e sua relação com a qualidade do serviço prestado pelas universidades federais. 

Foto: Acervo PessoalLuís Carlos Sales é professor Titular da Universidade Federal do Piauí. Professor do Programa de Pós-Graduação em Educação da UFPI.
Luís Carlos Sales é professor Titular da Universidade Federal do Piauí. Professor do Programa de Pós-Graduação em Educação da UFPI.

De início, é preciso dizer que qualidade é um conceito polissêmico. No serviço público, qualidade tem relação direta com quem realiza o atendimento e com a existência de alguém para realizar o serviço. Sem entrar no mérito da qualificação de quem realiza o atendimento público, o serviço precisa ser realizado, seja por um robô, seja por um humano. Portanto, enquanto existir a necessidade de um determinado serviço público, não se pode, por decreto, salvo exceções, dizer que não se precisa de um ser humano para realizar uma tarefa típica do serviço público.

Seguindo direção contrária, tem sido frequente, na instância Federal, a prática de extinguir cargos efetivos. O decreto nº 10.185, de 20 de dezembro de 2019 extinguiu, de uma só vez, 27,5 mil postos no Governo Federal, com a justificativa de se “adequar o serviço público aos tempos atuais”, ao extinguir postos como mateiro, seringueiro, discotecário, técnico de móveis e esquadrias. 

No caso das Universidades, de fato, a extinção de cargos traz economia para o Governo Federal, no entanto, transfere a responsabilidade orçamentária para as instituições federais de ensino, que efetivamente precisam de alguns desses postos extintos. Não se pode dizer que uma Universidade Federal não precisa de profissionais para fazer a segurança patrimonial da instituição, de cozinheiro para os Restaurantes Universitário e de intérprete de Libras para promover a inclusão.

A importância deste último profissional para as universidades, nos dias atuais, não pode ser comparada com a necessidade dos cargos de mateiro, seringueiro e discotecário. 

Por fim, não cabe aqui discutir o mérito da qualificação de quem realiza o atendimento público, nem o tipo de vínculo que tem o colaborador, nem a qualidade do serviço prestado. Diante deste cenário de extinção de cargos efetivos e transferência de responsabilidade, no mínimo, o que se espera é que a transferência de responsabilidade venha acompanhada do aporte de recursos necessário para garantir a continuidade do atendimento público nas Universidades Federais, para que possam continuar prestando, à sociedade, um serviço público de qualidade.

Luís Carlos Sales possui graduação em Engenharia Civil pela Universidade Federal do Piauí (1981), mestrado em Educação pela Universidade Federal do Piauí (1995) e doutorado em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (1999). Atualmente é professor Titular da Universidade Federal do Piauí. Professor do Programa de Pós-Graduação em Educação da UFPI e pesquisador do Núcleo de Estudos e Pesquisas em Políticas e Gestão da Educação (NUPPEGE).

Fonte: JTNEWS

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