Colóquio dos 13 anos da Lei Maria da Penha, em Cuiabá no Mato Grosso
"Essa lei não é para punir o homem, mas para proteger as mulheres de homens agressores", enfatiza Maria da PenhaO evento aconteceu em Cuiabá nessa sexta-feira (09), no Teatro Zulmira Canavarros da Assembleia Legislativa do Estado do Mato Grosso, e, o mais marcante para todos os participantes, foi a presença da mulher que deu o seu nome à Lei mais importante contra a violência doméstica no País; ela mesmo: Maria da Penha.
Maria da Penha Maia Fernandes está há 36 anos em cadeira de rodas, foram 19 anos e 6 meses de luta, dor e sofrimento, até que seu agressor fosse condenado; militante da causa em favor das mulheres [vítimas de violência doméstica], ela vive para encorajá-las.
Neste mês de agosto, dia 07 especificamente, a Lei Maria da Penha, completou 13 anos da data de sua promulgação. A lei é um divisor de águas na luta em face da violência doméstica contra a mulher, no entanto, infelizmente essa guerra está longe de acabar.
A Associação Brasileira de Mulheres de Carreira Jurídica -MT (ABMCJMT), a Coordenadoria Estadual em Situação de Violência Doméstica no âmbito do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (CEMULHER) e o Poder Judiciário do Estado, organizaram nesse dia 09 de agosto de 2019, um evento denominado: Colóquio dos 13 anos da Lei Maria da Penha.
O evento contou com a presença de Maria da Penha Maia Fernandes, professora Silvia Pimentel, Dra Arlete Mesquita, dentre outros, contudo, dois palestrantes me chamaram a atenção de modo especial, sobretudo, pelo trabalho que desempenham, quais sejam: a promotora de justiça, Dra Valéria Scarance e o juiz Dr. Ben Hur Viza.
#NamoroLegal
A palestrante, promotora de justiça no estado de São Paulo, Dra Valéria Scarance, publicou a cartilha Namoro Legal, sobre relacionamento abusivo, escrita de modo leve, com conotação bem tranquila, sem uso das palavras: violência, vítima e agressor.
O objetivo da cartilha é ajudar as meninas a identificar um relacionamento tóxico, o trabalho é preventivo. Sua fala enfatiza a questão da violência doméstica como sendo um problema público e não caseiro, a população esta letárgica, ou seja, as pessoas sabem que a violência doméstica tem assolado nosso país mas tratam isso como se fosse algo normal, sem maior importância, e é aí que mora o perigo, pois, milhares de mulheres são assassinadas todos os anos.
É também objetivo da cartilha, falar de violência sem falar "da violência", é conscientizar as jovens mulheres que contos de fadas não existem, os sapos e as feras não se transformam em princípes. A cartilha esta disponível na internet para quem quiser ler e até mesmo enviar para alguém que esteja vivendo em um relacionamento abusivo.
Maria da Penha vai à Escola
É necessário pensarmos no contexto geral da situação da violência doméstica, a lei por si só não faz com que atos criminosos deixem de ser praticados, percebo que muitas pessoas ficam felizes quando novos crimes são tipificados, ou quando aqueles já existentes são modificados para endurecer as penas, a pergunta que devemos fazer é a seguinte: por que a pessoa faz o que faz? E foi nesse ponto que eu fiquei um pouco aliviada ao saber do projeto Maria da Penha vai à Escola.
Foi apresentado pelo Dr. Ben Hur, juiz de direito do Distrito Federal, todas as particularidades do projeto voltado a educação de homens e mulheres, mais de trinta escolas na comarca que o juiz atua participam do projeto. Ele começou sua explanação afirmando que o trabalho em rede fortalece a luta no entanto segundo ele, só tem uma coisa que consegue dar conta da questão sozinha, a educação.
O objetivo do projeto é educar para prevenir e coibir a violência contra a mulher, fazem parte da parceria o TJDFT, MPDFT, Secretaria de Educação, Secretaria de Segurança Pública, Secretaria do Trabalho, Desenvolvimento Social, Mulheres, Igualdade Racial e Direitos Humanos, Secretaria de Políticas para Crianças, Adolescentes e Juventude, Polícia Civil do Distrito Federal, Polícia Militar do Distrito Federal, Defensoria Pública do Distrito Federal, OAB/DF, UnB, UniCeub.
Litígio internacional
A história de Maria da Penha Maia Fernandes, como de tantas outras brasileiras, foi bem triste, ela nos contou que sofreu duas tentativas de feminicídio no mesmo ano, ficou paraplégica em decorrência de um tiro de espingarda enquanto dormia, poucos meses depois quase foi eletrocutada.
O agressor, seu ex-marido, demorou muitos anos para ser condenado e preso, faltando apenas seis meses para o processo prescrever, ele acabou sendo preso, mas isso ocorreu por ter havido intervenção da Organização dos Estados Americanos (OEA), conforme dito por Maria da Penha; o Brasil é um de seus 21 fundadores, sendo membro desde 1948, essa organização tem por finalidade, basicamente defender a democracia e os direitos humanos.
Em 1998 o caso foi denunciado à OEA, entretanto, o Brasil não se posicionou acerca dos questionamentos. Toda via, em 2001 foi responsabilizado por negligência, omissão e tolerância em relação à violência doméstica contra as mulheres brasileiras.
E em decorrência das observações da OEA ao Brasil, várias Organizações Não Governamentais (ONGs) feministas, em 2002 uniram forças para elaboração da lei, muitas etapas foram cumpridas até o dia da sua promulgação em 07 de agosto de 2006, o estado do Ceará pagou a Maria da Penha uma indenização devido ao transtorno acarretado em sua vida.
Maria da Penha, solicitou que desmestifiquemos as falácias acerca da lei, ela afirmou categoricamente: "a lei não é para punir os homens, mas proteger as mulheres de homens agressores!" Mencionou suas filhas muito pequenas quando toda tragédia ocorreu, não só a mulher sofre, mas, sobretudo, a família, as vítimas invisíveis.
Disse ainda que a Lei Maria da Penha é uma das três leis mais avançadas no mundo, destacando que por si só, não acabará com a violência contra mulher, é necessário que haja uma sensibilização dos envolvidos no processo, do policial ao juiz, bem como uma desconstrução da cultura machista.
O evento contou com pessoas super gabaritadas, todavia, o espaço aqui é limitado, com certeza não faltarão oportunidades para discorrermos acerca deste tema tão triste, mas que o debate se faz necessário, pois quem sabe, assim mais e mais pessoas saiam da letargia e se conscientizem que não é normal a mulher ser violentada, seja essa violência física, psicológica, sexual, moral ou patrimonial.
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